Uma revolução lenta, um Portugal diferente

O país desmoronava-se… A antiga ordem, de característica desordem, cessou. Há quem diga que tudo ficou pior. Mas muitos diziam que preferem esta anarquia, destes dias, às injustiças camufladas de outrora.
Ninguém sabe ao certo como foi possível. Não houve golpes, não houve violência. Tudo se passou num continuar amorfo de autodestruição social. As estruturas sociais ruíram. Foi uma revolução sem precedentes.
Os Governos e o sistema financeiro caíram.
Agora só a capacidade humana de se constituir em grupos, mais ou menos organizados, nos permite viver. De toda a calamidade que atingiu o globo poucas realizações humanas restaram. Hoje as fronteiras são meramente culturais, sem ninguém que as vigie. A produção e trocas fazem-se quase ao nível mais primitivo da troca directa e da produção para a subsistência.
Por mais estranho que pareça, Portugal persistiu. Esta calamidade revolucionou Portugal. Todas as dificuldades contribuíram para o unir de um povo que já se habituara às agruras da vida, mas que, quando a necessidade aperta mais, lá “faz das tripas coração” e, como povo navegador, sempre fica à tona. Dos anos do primeiro choque um novo Portugal, que lembra o passado, emerge.

Mesas vazias

São estes momentos ininteligíveis,
estas conversas inaudíveis
que ecoam com os sons
estridentemente sem tons,
por simplesmente soarem a nada

Nada se percebe o que dizem.
Mas porque haveríamos de perceber?
Eu não, já me perdi a esquecer
aquilo que agora é audível e vem
junto do convívio da minha mesa.

É às mesas que se sociabiliza,
é nelas que se confirma o vazio
de uma sociedade que em tudo rivaliza,
especialmente pelo vazio,
pelo vazio cheio de vazio!