Viver na Quente Incerteza

Lá fora tudo se derrete
À sombra de um sol que funde,
Com a luz que lhe compete.
Ninguém evita que se afunde
A massa pastosa da outrora sólida
Estrutura, agora flácida e estólida.

A ruina é incerta.
A queda variável.
Surge uma aberta
Pouco ou nada viável.
À falta de alternativa
Prossegue a comitiva,
Na esperança de encontrar
As bases sólidas onde fundear.

No exterior teme-se a altura.
No interior teme-se a ruina da pedra.
Junto à terra foge-se à abertura
Que do sismo por vezes medra.
Pelo ar corre um vento quente
Errante que seca e mirra a mente.

A segurança desapareceu,
A ilusão desfaleceu.
Mas ficámos mais fortes na fraqueza.
Voltámos à primordial rudeza.
Voltámos a ser sobreviventes na incerteza!

Famílias paralelas (paradoxais)

O pai, conservador, tinha um caso com um homem. A mãe, feminista, comprovava que, mais que tudo, gostava de mulheres. Os filhos, em segredo, fizeram-se adotar por 2 país e 2 mães.

O consciente medo da sabedoria arrogante


Dou a volta à minha fortaleza,
Com a minha arrogância de realeza,
Observo das frestas à distância.
Tudo continua imundo em constância.
Lá continuam na ignorância do comer,
Alimentam-se só porque tem de ser.
Beber sem satisfazer uma sede de saber,
Desse desconhecido não tiram prazer.

Tão voraz como os demais,
Alimento-me sem comensais.
Não deixo ninguém chegar perto,
Atras da muralha. Fico no deserto
Da companhia de mim mesmo,
Sempre o mesmo próprio esmo.
Mas não subsisto sem o alheio,
Quer seja de superfície ou recheio.
Sou hipócrita no forte que me abriga,
Sou incoerente  por evitar o ataque e briga.

Alimento-me daquilo que gosto
Longe de estar justaposto ou exposto.
Como sem maneiras nem galanteias
De o partilhar com as assembleias.
Sou um nobre mordaz e arrogante
Que critica de escudo acutilante.
Mas pelo menos sei que sou assim
Um sem fim consciente de mim.
Para sempre viveria no castelo
Feito de ilusões onde me aquartelo.
Dos que diminuo uso para comparação
Alimentando a ilusão da dominação.

Espero que nunca me destronem,
Que nunca fraco me encontrem,
Pois não saberia viver de outro modo.
Não saberia viver em comunidade,
Não conseguiria viver sem a identidade
De me enganar, em jeito de vaidade,
Com o meu superior saber de superioridade.

Talvez um dia encontre a paz interna
Para me fazer abrir as portas e caserna.
Talvez um dia derrube as torres e muralhas,
Encha o fosso e reutilize pedras com talhas.
Se nas demolições por cá ficar sepultado
Talvez um dia seja por quem critico amado.
Eu próprio comia sem odre o putrefacto
Para me tornar mais vazio. Correria pelo mato!
Mas só o faria se soubesse que a humildade
Verdadeiramente realizasse a humanidade.